segunda-feira, 13 de julho de 2015

... e aí, quando eu olhei bem de perto, vi que não merecia tanta atenção assim...




























Quando eu pensava que já havia 
experimentado todos os tipos de amor,
veio a vida e me mostrou 
um novo jeito de amar: 
PEDRO, meu neto!!!
Olhar seus olhos azuis 
é mergulhar no mar da tranquilidade
sem precisar sair da Terra, 
por que ele é capaz de me levar ao céu,
só pelo fato de existir.

Igarapé das Sombras


Havia um cheiro diferente no ar. Um adocicado aroma de frutas maduras. Isso acontecia cada vez que ela passava, rebolando as ancas, com seu andar cadenciado, empinando os peitinhos que lembrava pequenos abius colhidos no pé. Na cabeça, a grande trouxa de roupas que diariamente batia no Igarapé das Sombras, onde muitos juravam ter visto assombrações.
Mas o jirau era seu porto seguro. Lenita nada temia. Ainda mais, por sentir-se resguardada pela medalhinha de Nossa Senhora do Carmo, sua madrinha de devoção, desde que fora abandonada sobre o velho trapiche na antiga colônia de leprosos no bairro das Irmãs Carmelitas.
Com movimentos suaves de ariramba em leito de rio, Lenita desce a trouxa, arregaça as saias, deixando desnudas as pernas morenas, que reluzem nas réstias do escaldante sol amazônico. Na cuia, o sabão feito em casa, as buchas e o anil, que ela delicadamente põe de lado, iniciando mais um dia de trabalho árduo. Como companhia apenas o vento que assobia em seus ouvidos, fazendo-a arrepiar, brincando com seus grossos e negros cabelos e os pássaros que teimam em trinar seu canto em volta dela, tentando desfrutar do néctar almiscarado que emana de seu suor.
Meio dia, sol a pino. Ela prepara a jacuba para acompanhar o naco de peixe seco que trouxe na lata. Come enquanto observa a roupa no quarador.
O tempo é abafado e modorrento, deixando Lenita com a sensação de lânguida embriaguez. O capim a convida a um cochilo e ela aceita sem cerimônia, abandonando-se ao sabor dos sonhos.
Uma luz pálida reflete em suas pálpebras e ela desperta espreguiçando-se. No igarapé outrora vazio, crianças pulam e brincam em algazarra, enquanto os botos exibem suas coreografias muitas vezes ensaiadas. Lenita esfrega os olhos esperando que tudo desapareça.
Estaria ela em alguma cidade encantada? Num reflexo incontido, cobre as coxas e prende os
cabelos, buscando por sua medalhinha que já não está consigo. Vê que os pequenos arbustos se contorcem em alvoroço, apesar da falta de vento. De súbito é tomada por maus presságios, afinal, muitas são as histórias de assombrações nessas bandas. Sacis, Curupiras, Botos e Mães d’Água que encantam. Desesperada, tenta correr, fugir dali, mas escorrega no limo das margens e vai afundando nas águas frias cor de guaraná do Igarapé das Sombras, até que o riso das crianças a faz despertar desse pesadelo insano.
Senta-se, mas continua a ouvir vozes e percebe que o mato ainda se agita. Armada com o cacete de bater roupa, Lenita investe contra a moita tremulante, açoitando-a. Gritos estridentes a fazem paralisar, quedando-a chocada, ante um grupo de moleques em práticas onanistas.
Dizem que desde esse dia, o encantamento do Igarapé das Sombras foi quebrado.

O Preço da Fama